Sim, eu tenho preconceitos!


Ninguém quer ser um preconceituoso, ou melhor, ninguém quer ser considerado um preconceituoso. Segundo o imaginário popular vigente, não é politicamente correto ter preconceitos, pior ainda pronunciá-los por ai.

Se você for minimamente honesto vai admitir que é um preconceituoso. Mas vai notar que também sofre muitos preconceitos. O que me incomoda nesse assunto é a nossa incapacidade de admitirmos os nossos preconceitos e admitindo-os, superá-los. O que me leva ao medo é que o preconceito é a causa primeira de toda intolerância. E a nossa é uma das sociedades mais intolerantes da história.

Eu imaginava que a universalização da internet e o acesso às mídias sociais aproximariam as pessoas de modo a tornar as diferenças aceitáveis e compreensíveis. Só que não, estar longe do outro e diante da tela de um PC apenas tornam o preconceito e a intolerância que nos são inerentes, mais agudos. Civilizados mesmo são aqueles que conseguem controlar sua resistência às diferenças e ao desconhecido e ao mesmo tempo estabelecer diálogos.

Não sou uma pessoa livre de preconceitos, já sofri com eles. Sofri preconceito de professores e colegas de outros cursos por estudar Administração, de pessoas de esquerda por ser membro de um partido de direita, de ateus por ser cristão, de cristãos por ser batista, de batistas por questionar coisas erradas dentro da igreja. Já sofri preconceito de pessoas de outras cidades por morar numa cidade considerada violenta. Sofri preconceito de familiares por “ler demais”, uma vez fui vitima de preconceito simplesmente pelo fato de fazer parte da Associação Comercial da minha cidade. E a experiência mais traumática talvez tenha sido sofrer preconceito porque meu pai faleceu vitimado pela AIDS. 

Não sou um ser livre de preconceitos, já os cultivei. Porém hoje, mais do que nunca eu acredito que preconceito se supera a partir da convivência, do estabelecimento do diálogo e do cultivo do senso da dignidade da pessoa, valor inerente a cada ser humano. Superei meus preconceitos contra ateus quando fiz sociedade e montei uma empresa com dois deles. Meus preconceitos contra negros, baianos e nordestinos em geral acabaram quando passei a conviver, me apaixonei e comecei a namorar a pessoa mais maravilhosa desse mundo

Meus preconceitos contra homossexuais acabaram quando fiz amigos gays e passamos a trabalhar diariamente. Superei meus preconceitos contra marxistas em geral e pessoas de esquerda quando me aproximei deles e permiti que se aproximassem de mim, entendendo que é preciso também discutir nossa forma atual de organização econômica e social. Superei meus preconceitos contra dependentes químicos quando me deparei com a necessidade de conviver e ajudar dois familiares naquela situação. Superei meu preconceito contra ex-presidiários quando passei a conviver com um deles dentro de casa, e então passei a acreditar que ressocialização não é só uma palavra bonitinha no código penal. 

Agora “só” falta superar meus preconceitos contra quem escreve errado, contra quem não gosta de ler, contra palmeirenses, são-paulinos e flamenguistas, contra funkeiros, contra o sertanejo universitário, contra funcionários públicos, congressistas e políticos em geral. Além destes, eu tenho muitos outros dos quais não lembro agora, mas que de forma velada ou explícita se manifestam diariamente. 

Espero poder superá-los, e espero que este processo de eliminação de preconceitos e inutilização das minhas intolerâncias me faça uma pessoa melhor, me faça conhecer novas pessoas e me faça valorizar ainda mais aquelas que estão perto de mim. E você? Quais são seus preconceitos?

PS: 


POSTED BY Unknown
DISCUSSION 2 Comments

2 Responses to : Sim, eu tenho preconceitos!

  1. Anônimo says:

    O grande paradoxo, Haralan, é que o preconceito não é uma opção do ser humano. Antes, é uma característica inata, um padrão biológico de funcionamento do cérebro. Tudo aquilo que incorporamos através dos nossos sentidos é dividido em categorias na nossa mente. Quando estas características têm uma conotação social, elas são chamadas de estereótipos - e quando se faz julgamento de valor destes estereótipos, surgem os preconceitos.

    Abraço, Rodolfo.

  2. Unknown says:

    Olá Rodolfo,

    Entendi o que você disse. Talvez seja por causa deste paradoxo que as pessoas têm tanta dificuldade para lidar com o assunto. Afinal, é difícil para as pessoas admitirem que o preconceito não é uma opção.

    Abraço!

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