Tanto no pessoal, quando no profissional....
Eu estava no ônibus e duas fofoqueiras
senhoras comentavam situações do seu dia de trabalho quando o Fulano de Tal, um
colega de empresa, surgiu na conversa. Sobre
ele, a opinião de ambas era oposta e ao mesmo tempo idêntica. Uma delas disse -
“Eu gosto de Fulano como pessoa, mas não como profissional” - ao que a outra
respondeu – “Já eu não gosto muito dele como pessoa, mas é um bom profissional”.
É conhecida de muita gente uma frase do
Faustão quando se refere a qualquer pessoa que ele não esteja interrompendo “O
Ciclano é uma grande pessoa tanto no pessoal, quanto no profissional”. Acho que foi minha namorada que
me disse que este hábito se chama “fatiar as pessoas”. Então eu diria que todos
nós somos Jasons Filosóficos, porque além de um hábito, o “fatiamento” das
pessoas chega a ser um modelo mental que adotamos no dia-a-dia. Depois de
concluir o curso de Administração fiquei com a estranha impressão de que a
principal coisa que eu aprendi lá foi estereotipar as pessoas. Passei a olhar minha
família e amigos sob uma ótica psicográfica, todos passaram a se encaixar em um
segmento, um nicho. Esqueci-me que as técnicas de segmentação funcionam para aglomerados, mas não prestam no campo individual.
O Carlos Nepomuceno aborda este assunto de maneira filosófica, segundo ele a nossa ciência é uma ciência de
assuntos e não de problemas. Assuntos são rígidos e dogmáticos, “nos levam a ampliar a nossa humanice de
adorar uma tribo, um grupo, a criar um dialeto e, a partir disso, começar a se
separar dos outros, entre os ‘que entendem’ e os que ‘não entendem’”.
Avalie se você também não é um
produto dessa indústria do fatiamento e dos estereótipos. Quando você nasceu
sua roupinha era rosa (se você for menina) ou azul (se você for menino). Você
estudou por pelo menos 10 anos em uma escola onde a “educação” era segmentada
por disciplinas. Na faculdade a mesma coisa, um monte de assuntos separados em
disciplinas que só te ensinam a reproduzir conceitos e resolver equações, mas não
te ensinam a resolver problemas práticos, criar soluções, lidar com situações
diferentes dos cases que você via
naquela matéria que considerava inútil e cujo professor era chato e
despreparado.
Depois vem o emprego e você passa
a ser conhecido como o cara do marketing, ou rapaz do RH ou o fulano do
financeiro. O sujeito passa a ser conhecido e interpretado de acordo com um
único aspecto da sua personalidade. Algo que escapa completamente à realidade. Ocorre
que este modelo mental cartesiano, que não consegue lidar com abstrações e problemas
complexos sem fatiá-los é nocivo quando é a única forma de pensar que adotamos.
Isso porque ela potencializa nossos preconceitos e alimenta intolerâncias. É só
acompanhar as brigas “sangrentas” que acontecem nas redes sociais porque alguns
usuários adotam o estranho hábito de passar o dia compartilhando o Brasil navisão dos paranaenses e afins.
Se nossa ciência deveria ser a
dos problemas e não dos assuntos, quanto mais nossa prática cotidiana, deveria
ser a de pessoas e não dos rótulos. Problemas e pessoas são interdisciplinares,
são complexos e não deveriam ser reduzidos a um aspecto ínfimo de sua
totalidade.
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Agora sim deu pra enxergar você nesse texto ;)
Eu tenho alimentado a ideia de que as pessoas devem ser inteiras, não fatiadas, para que sejam vistas por inteiro, não por fatias. Quem se modela conforme a situação - não falo de simples adaptação, de mascaramento mesmo; gente que é diferente no pessoal, no profissional, no conjugal, no fraternal, no espiritual, no intelectual... cada fatia é tão desfigurada que elas não se juntam mais. A pessoa não é mais inteira, fica irreconhecível até diante do espelho. Quando se chega nesse estado, não dá pra exigir que as pessoas a enxerguem de outro jeito, senão conforme as fatias que ela mesma recortou.